sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

3a Corrida de Canoas "Amigo Pescador" Projeto Tamar

Muito já ouvi sobre as corridas de Canoas Caiçaras acontecidas na década de 1960 na Praia da Enseada em Ubatuba.
Me contaram que o "circuito" saía defronte ao Porto do Eduardinho, dava a volta na Lage Grande e voltava, coisa de um par de quilômetros só para canoas de pescador legítimas.
Fim de semana passado aconteceu na Enseada de Ubatuba uma bela reedição desses tempos áureos das Corridas de Canoas.
Promovida pelo Tamar, a Corrida de Canoas Amigo Pescador reeditou a categoria 4 Remos num circuito pra lá de profissional, com 9 Km de extensão.
A prova que esses percursos longos são muito valorizados pelos pescadores locais foi a participação de Mestres Caiçaras como o Seu Gino (70 anos!), Elias e Dionísio mostrando que quando a distância aumenta vale mais a experiência do que a força.
Saindo dos Ranchos do Itaguá, passando pelo Cais do Magalhães, depois uma reta do Caisão até a marisqueira do Seu Gino e voltando aos ranchos, coisa pra Pescador com "H" maiúsculo!

Seu Gino na Proa, seguido pelo neto Helbert, o primo Nelsinho e o filho Nélio na popa.

Valeu rapaziada! parabéns!

Todas as fotos são de Fernando Alvarenga e Fabio Haguihara do Projeto Tamar, facebook álbum de Henrique Becker.


quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

A FUNDART de Ubatuba amplia o acervo sobre a Canoa Caiçara.

fonte: Fundart - http://fundart.com.br/contribua-com-campanha-pelo-registro-da-canoa-caicara/

Contribua com a Campanha pelo Registro da Canoa Caiçara

A Canoa Caiçara, bem cultural imaterial brasileiro, em processo de registro no IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, conta com a colaboração da população no inventário oficial.

O requerimento de registro da Canoa Caiçara como bem cultural imaterial brasileiro foi encaminhado para o IPHAN em 2012, pela Associação de Pescadores da Enseada de Ubatuba. Em abril de 2013, o Conselho Consultivo do IPHAN iniciou uma campanha junto aos órgãos competentes pelos processos e práticas culturais referentes à Canoa Caiçara dentro de seu território cultural.

A Campanha que localizará, identificará e mapeará semelhanças e técnicas construtivas dos Mestres Canoeiros com o objetivo de preparar o processo de registro em todo o litoral sul fluminense, paulista e norte paranaense, agora conta com você que possui imagens ou textos antigos que possam colaborar com o documento oficial.

A FundArt reuniu toda a sua documentação – fotos e registros oficiais na cidade de Ubatuba, inclusive o “Livro de Ouro” da Canoa Maria Comprida em sua viagem a Santos em 1973 para compor o inventário.

Interessados em colaborar poderão entregar uma cópia do material até o dia 13 de dezembro, próxima sexta-feira, na seda FundArt – Praça Nóbrega, 54 – Centro, das 8h às 12h e das 14h às 18h. Telefone: (12) 3833-7000.

foto: Élvio Damásio - Ubatumirim

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

A FANTÁSTICA CORRIDA DE CANOAS DO UBATUMIRIM

Imagens impressionantes da força das ondas que os Canoeiros Caiçaras enfrentaram no Ubatumirim!
foto: Carolina Barbosa

foto: Mario Ricardo de Oliveira facebook

foto: Matheus Pereira - Tamar 
VAI FICAR NA HISTÓRIA ESSE EVENTO!


terça-feira, 26 de novembro de 2013

SÓ MAIS TRÊS ANOS DE VIDA PARA O MERO?!

 Hoje serão poucas palavras para um simples questionamento: 

- Que benefício poderá ter, matar um Mero?! 

Na imagem abaixo, um mergulhador que na Enseada do Flamengo arpoou um "Merote" de apenas oito quilos encontrado próximo a uma estrutura artificial de concreto construída no final dos anos 80.
foto: A.P.E.
O mergulhador veterano Edgard Prochaska, que caça na região desde início dos anos 50, conta em seu livro Caçadores Submarinos (Editora Phorte, 2009), toda a trajetória histórica da Caça Submarina no país.
Na página 329 ele ensina sobre o Mero:
"Em razão do seu tamanho, é um troféu cobiçado pelo caçador submarino, mas, a respeito do seu grande volume e força é muito confiado e manso, permitindo que dele nos aproximemos bastante. Essa mansidão, que até lhe valeu o apelido de burrão, geralmente lhe custava a vida. Sua pesca foi tão intensa nas últimas décadas de caça submarina que hoje praticamente desapareceu das águas do sudeste brasileiro. (...) Esperamos que essa lei de proteção estenda-se por tempo indeterminado, pois não há razão para abater esse animal raro - com finalidade alimentar - da mesma forma que não existe um motivo para caçar um rinoceronte. São animais simbólicos da fauna que devem ser preservados para as gerações futuras poderem interagir com eles turística e pacificamente".
Em outros trechos descreve Meros enormes e o modo como foram abatidos e cita um caso em que um caçador submarino afamado estabeleceu um "recorde sangrento"matando 16 meros em um só dia, amealhando duas toneladas de peixe nobre para ser vendido no mercado.

O Mero é tão Itajara - "Senhor das Pedras", que sem predadores não teme nem ao homem, tornando-se alvo fácil. Veja o vídeo do mergulho com um Mero: Mergulho 5 min.
foto: institutoecoacao.blogspot.br
Texto a seguir: http://pt.wikipedia.org/wiki/Mero
O Mero (Epinephelus itajara) é um peixe que pertence à família dos serranídeos, e representa, juntamente com garoupas, chernes e badejos, uma das maiores espécies de peixes marinhos, podendo chegar a pesar de 250 kg a mais de 400 kg e medir até quase 3 metros.
Estes peixes são extremamente susceptíveis à captura, por possuirem o hábito de agregar-se para a reprodução, comportamento destemido em relação ao ser humano e tamanho impressionante, que lhe valeram alto valor comercial e desportivo, quando capturados por caçadores submarinos. Estas características, associadas a um longo período de geração, com taxa decrescimento populacional lenta e maturação sexual tardia, a partir dos 60Kg, resultaram em sério risco de extinção da espécie, que não possui predador natural.
São encontrados em lajes, estuários e manguezais, bem como em naufrágios e até mesmo em plataformas, freqüentando locais com fundo de pedra e grandes tocas, ocorrendo em todo o litoral brasileiro.
Sua pesca, captura, transporte, comercialização, beneficiamento e industrialização foi proibida pela Portaria IBAMA Nº 121 de 20 de setembro de 2002, até Setembro de 2007, tendo sido prorrogada por mais cinco anos pela portaria Nº 42 de 2007.
Está prevista na Lei de Crimes Ambientais, uma multa de R$ 700,00 a R$ 1.000,00. Pena que varia de 1 a 3 anos de detenção pode ser aplicada aos infratores que pescarem os meros.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

POIS ENTÃO... FALAR O QUÊ NÉ?

Enquanto a Canoa Caiçara luta pra ser reconhecida, alguns "gênios" insistem na cultura alienígena da canoa havaiana e agora até da totora! O motivo é simples: a Canoa Caiçara pressupõe o domínio sobre um Território Caiçara e isso é uma ameaça aos especuladores do nosso litoral. Atenção Caiçarada!! Vem trovoada por aí!!

fonte: O Guaruçá: http://www.ubaweb.com/revista/g_mascara.php?grc=46346
Ilhabela resgata os Caballitos de Totora
 
 
Remar como dois mil anos atrás será uma experiência única, lançada exclusivamente pelo DPNY. Caballitos podem ter originado o surf mundial
Divulgação 
Em uma ação inédita no Brasil, o DPNY Beach Hotel lançará nesta terça-feira, 19, em Ilhabela, no litoral norte de São Paulo, os Caballitos de Totora, o primeiro Stand Up Paddle (SUP) conhecido da humanidade. A partir desta data, hóspedes, moradores e turistas terão a oportunidade de remar pelas águas da Praia do Curral exatamente como era feito há dois mil anos, quando as primeiras embarcações surgiram no norte do Peru.
A importação de 10 unidades ocorreu após o DPNY Beach realizar uma longa e detalhada pesquisa para se descobrir a origem deste tipo de embarcação, que hoje conhecemos como Stand Up. “O SUP surgiu há dois mil anos no Peru. E é de lá que esses equipamentos, produzidos artesanalmente, foram importados, em parceria com a Promperú (Comissão de Promoção do Peru para a Exportação e o Turismo)”, explica Heiko Obermüller, diretor geral do DPNY. Na literatura recente há indícios de que os Caballitos originaram o surf mundial.
Segundo Obermüller, o Projeto Caballitos de Totora surgiu após o hotel registrar entre os hóspedes intensa procura pelo Stand Up, a maioria proveniente da Capital e interior de São Paulo. “Buscamos informações sobre a origem do esporte que mais cresce no meio náutico e descobrimos que esta modalidade surgiu há mais de dois mil anos, no Norte do Peru”, acrescenta. Os Caballitos, inclusive, foram declarados Patrimônio Cultural Nacional daquele país.
Mas ainda segundo Obermüller, há teorias de que os Caballitos de Totora (“cavalo de cana”) surgiram no Egito há quatro mil anos e foram parar no Peru há dois mil anos, após os egípcios colonizarem o país sulamericano.
“Por isso este tipo de embarcação somente existia no Peru e no Nilo”, ressalta o diretor do DPNY Beach Hotel.
Precursor do SUP
O DPNY foi um dos precursores do Stand Up Paddle no Brasil. Em 2006, quando o esporte ainda era desconhecido da maioria dos brasileiros, turistas que se hospedavam no hotel já davam suas primeiras remadas pela Praia do Curral, em Ilhabela, e ficavam deslumbrados com a possibilidade de “surfar” lentamente, apenas remando.
“Vamos organizar passeios em grupos, sempre acompanhados por profissionais treinados. Independentemente das nossas pesquisas e da história do esporte, o que importa é escrevermos a história e temos certeza de que estas maravilhas conquistarão rapidamente todas as praias do litoral brasileiro e esperamos que seja uma nova tendência. Remar como dois mil anos atrás será uma experiência única, lançada exclusivamente pelo DPNY em conjunto com Promperú”, finaliza Obermüller.
A vinda dos equipamentos fará parte da Semana Peruana no DPNY Beach Hotel, que será realizada nos dias 19 e 20 de novembro, por meio de parceria com a embaixada do Peru no Brasil, em uma ação que será desenvolvida para divulgar o turismo peruano.
Embarcação é feita com caules e folhas de taboa
Os Caballitos de Totora (“Cavalo de Cana”) são produzidos artesanalmente com caules e folhas de taboa (Scirpus californicus) e projetados para transportar um velejador com a sua engrenagem e para pesca marinha no Peru e em lagos da Bolívia e Peru. A extremidade dianteira (proa) é mais afiada e curvada, com a traseira mais ampla.
As embarcações têm entre 4,5 a 5 metros de comprimento e largura de que varia de 60 centímetros a um metro e peso varia entre 47 kg e 50 kg a 200 kg, podendo suportar cargas. Por três mil anos sua concepção não teve alterações.
Em algumas praias da costa peruana, como Huanchaco e Pimentel, estes barcos são usados também para o surf esportivo. Nos tempos antigos, era o símbolo de respeito para o povo da costa peruana pelos fios sutis que tecem o equilíbrio ecológico. Na antiga língua da área são chamados de "wachakes", uma palavra que pode ser traduzida como "buraco de água" e dizem que dá nome ao Huanchaco, um dos últimos redutos de cavalos de juncos no Oceano Pacífico.
O elemento representativo dessa antiga tradição é o uso de totora cavalo, fundamentais herança culturas Mochica e Chimu, que têm sido mantida ao longo do tempo e é um importante símbolo de sua identidade, com um valor histórico imensurável.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

CORRIDA DE CANOA CAIÇARA UBATUMIRIM 2013

Um dos melhores eventos de corrida de Canoa Caiçara do litoral norte de São Paulo acontecerá pela terceira vez na Praia do Ubatumirim em Ubatuba. Depois o tradicional Fandango Caiçara.



segunda-feira, 28 de outubro de 2013

20 MIL ACESSOS AOS VÍDEOS E TEXTOS DA INSTITUIÇÃO CANOA CAIÇARA

Ao iniciar nossa pesquisa sobre a Canoa Caiçara no ano de 2007, percebemos que quase nada havia de específico sobre essa embarcação tradicional típica.
Isso nos levou a iniciar uma grande compilação de diversos tipos de materiais e informações que se encontravam espalhadas. Desse esforço surgiu o Blog e o Canal do Youtube onde passamos a concentrar todo esse acervo de pesquisa.
E foi com grata surpresa que notamos dia após dia um crescente interesse pelos vídeos e artigos postados que nessa semana atingiu a marca de 20 mil acessos.

Ao longo desses anos de atividade, esse interesse de pessoas diversas em torno dos saberes e fazeres relacionados à Canoa Caiçara criou um canal de comunicação que aglutinou e fortaleceu as iniciativas de salvaguarda das técnicas construtivas desse tipo de embarcação.
Hoje está em análise o Registro da Canoa Caiçara como Bem Cultural Imaterial Brasileiro pelo Iphan.
Agradecemos aqui de forma singela a todos que de forma direta ou indireta têm contribuído para o fortalecimento do que já está se delineando como a "Instituição" Canoa Caiçara.
A todos vocês nosso MUITÍSSIMO OBRIGADO!


quinta-feira, 24 de outubro de 2013

"RECATEGORIZAÇÃO DA RESERVA JUATINGA, PODE EXTINGUIR A CANOA CAIÇARA"

Fonte: http://www.hojeemdia.com.br/noticias/brasil/transformac-o-da-reserva-da-juatinga-em-parque-estadual-ameaca-canoa-caicara-1.185166

24/10/2013 08:42 - Atualizado em 24/10/2013 08:42
Transformação da Reserva da Juatinga em parque estadual ameaça canoa caiçara

Tradicional embarcação poderá ser extinta com a proibição de retirada de madeira na região

RIO DE JANEIRO – A tradicional canoa caiçara, esculpida em um único tronco de árvore, corre o risco de desaparecer. Utilizada para a pesca por gerações em Paraty, no sul fluminense, a canoa não poderá mais ser feita se os caiçaras forem proibidos de coletar os troncos na Reserva Ecológica da Juatinga. O problema será discutido nesta quinta-feira (24) na consulta pública sobre a transformação da reserva em parque estadual, a chamada recategorização, no município.

A proposta de mudança faz parte do esforço da Secretaria Estadual do Ambiente para se adequar à lei federal que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc). O modelo não prevê a categoria “reserva ecológica” e sugere 12 modalidades. Entre elas, além do  parque, está a reserva de desenvolvimento sustentável (RDS), que tem a preferência de comunidades caiçaras na Mata Atlântica de Paraty.
Foto: Peter Santos Németh

Um dos últimos mestres canoeiros e vice-presidente da Associação de Moradores do Pouso da Cajaíba, comunidade da região, Francisco Sobrinho, diz que com a mudança fazer canoas não será a única coisa que se tornará mais difícil. Segundo ele, a modalidade inviabilizará a sobrevivência do grupo.

“Se já é difícil com a [lei ambiental] de reserva ecológica, que dificulta a reforma de nossas casas, será ilegal fazer roça, pescar, pegar uma casca [de árvores] para remédio, cipó para artesanato, tirar madeira para a canoa, remo ou passar pelas trilhas de séculos que dão acesso às nossas comunidades [acessíveis somente por barco]”, explicou.

Para defender a RDS e barrar a recategorização da Juatinga para parque estadual, os caiçaras de Paraty organizam uma manifestação hoje, durante a consulta popular organizada pela Secretaria Estadual do Ambiente na cidade. O objetivo do governo é resolver diversos conflitos fundiários, que envolvem a histórica grilagem de terras na região, a especulação imobiliária, além de preservar a Mata Atlântica.

Na proposta do estado algumas áreas serão transformadas em parque e outras em RDS. Porém, nenhuma das duas categorias resolverá de uma vez os problemas locais, na avaliação da geógrafa pela Universidade de São Paulo Lúcia Cavalieri, que estuda o tema na região há 20 anos.

“O parque vai expulsá-los de lá. Já a RDS permitirá um mosaico de propriedades públicas e privadas, beneficiando grileiros que também têm como prática expulsar os caiçaras para a construção de condomínio de luxos ou hotéis”,  alerta a pesquisadora. “É a solução mais fácil, mas não resolve”, completou.

Para ela, poderia ser estudada a criação de reserva extrativista, inventada pelo ambientalista Chico Mendes. “O Brasil já colocou esta reserva como modelo para  a preservação da Amazônia. Por que não para a Mata Atlântica?”. No projeto atual, ela alerta que as comunidades ficarão confinadas na área costeira.

O diretor de Biodiversidade de Áreas Protegidas da secretaria, André Ilha, defende a recategorização de uma parte em parque e outra em RDS. Ele assegura que não haverá remoção de núcleos familiares como os da Praia do Sono e do Pouso, e que o parque não será contíguo. “Dá para fazer sem abrir mão da preservação da floresta no longo prazo e sem prejudicar o desenvolvimento das comunidades”.

Depois de definir o modelo que substituirá a Reserva da Juatinga, a proposta deve ser aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio. Enquanto a decisão não é tomada, as comunidades caiçaras fazem campanha para que  o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) declare a canoa caiçara um patrimônio imaterial. O órgão já julgou o pedido pertinente.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

INOVAÇÕES TÉCNICAS NA PESCA, FORMAM A IDENTIDADE CAIÇARA


Fonte: http://www5.usp.br/32601/segundo-estudo-da-fflch-inovacoes-tecnicas-na-pesca-ajudaram-a-formar-identidade-caicara/

Rúvila Magalhães / Agência USP de Notícias

A pesca é uma atividade comum no litoral de São Paulo e está sempre agregando inovações às suas técnicas, mas sem perder as origens herdadas pela tradição. Grande parte das mudanças foi surgindo de iniciativas individuais ou de pequenos grupos. Como características históricas do progresso, as novidades úteis são mantidas enquanto o que pouco agregou acaba caindo em desuso. A evolução histórica das técnicas de pesca utilizadas pelos caiçaras do litoral paulista entre os anos de 1910 e 2011, e suas implicações socioambientais, foi o objeto de pesquisa do analista ambiental e historiador Marcelo Afonso, realizada na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
Foto: Peter Santos Németh

O objetivo do estudo foi mostrar que mesmo que as inovações técnicas tenham se instalado na pesca dos caiçaras, elas não foram responsáveis por eliminar a identidade do grupo. Ao contrário, a assimilação de novas técnicas contribuiu para a formação da identidade. “Muitas das inovações, como o cerco flutuante trazido pelos japoneses na década de 1920, e o uso dos diferentes materiais como o plástico e o náilon, foram adaptadas e incorporadas na cultura caiçara, que desde sempre foi marcada pela heterogeneidade, pelo dinamismo e pela mudança na busca pela sobrevivência”, exemplifica Afonso.

Além disso, foram delimitados alguns marcos referentes à introdução da pesca industrial tendo como objetivo verificar a participação que esse tipo de pesca teve nas transformações ligadas às técnicas utilizadas e às relações de trabalho entre os pescadores. Entender como o estilo de vida do pescador artesanal mudou com a introdução dos barcos de pesca industrial também figurou entre os objetivos do estudo.

Evoluções seletivas
A análise de um século de história sobre a pesca no litoral paulista mostrou ao pesquisador que as evoluções e modificações foram seletivas. Novas técnicas só eram adotadas pela maioria quando estas mostravam-se eficientes. “A comunidade espera para ver se o novo método ou petrecho está funcionando e, se for comprovado que ele dá bons resultados, uma parte dos pescadores passa a aceitá-lo e utilizá-lo, até o surgimento de uma outra nova técnica (trazida por pessoas de fora, ONGs, governo etc.), que passará pelo mesmo processo”, explica.

Esse processo de testes e adaptações de técnicas gerou uma gama variada de pescadores trabalhando simultaneamente com diversos tipos de pesca, o que fez surgir diferenças sociais internas e aumentou a competitividade entre os pescadores, causando, algumas vezes, conflitos que geraram falta de união em momentos importantes para as comunidades. A ocorrência da multiplicidade de técnicas, porém, revelou a capacidade dos caiçaras em se adaptar às adversidades econômicas, sociais e ambientais durante todo o século passado.

As transformações
“As transformações técnicas na pesca paulista, no decorrer do século 20, foram mais intensas principalmente nos novos materiais de fabricação dos petrechos, nas embarcações com motores mais possantes e com maior capacidade de carga e nas tecnologias de navegação e captura do pescado”, relata Afonso acerca das evoluções. Segundo ele, os marcos importantes para a pesca no século 20 foram a introdução da traineira, em 1910, do motor de centro e do power block, que é um tipo de guincho motorizado para recolhimento de redes, e do GPS, sonar e ecossondas.

Dados do Instituto de Pesca, coletados desde a década de 1960, apontaram para uma redução do pescado, sendo que 2011 teve o menor volume de pesca nos últimos anos, apesar do aprimoramento tecnológico. Pescadores entrevistados em todas as partes do litoral paulista afirmaram que isso vem acontecendo devido à pesca excessiva realizada por embarcações industriais. No entanto, pesquisadores do tema rebatem dizendo que o poder de captura dos pescadores artesanais também é um influenciador nesse caso. Somado a isso, tem-se a degradação dos ecossistemas marinhos, que pode explicar a redução na quantidade de peixes.

A dissertação de mestrado História de pescador: um século de transformações técnicas e socioambientais na pesca do caiçara do litoral de São Paulo (1910-2011), orientada por Gildo Magalhães dos Santos Filho e defendida em agosto de 2013, contribui na construção de um histórico das transformações técnicas e de outros fatores socioeconômicos e políticos ligados ao setor. Segundo o pesquisador, o reconhecimento dos caiçaras como população tradicional é essencial para a sua inclusão social e econômica, assim como o conhecimento de sua história e técnicas é importante na autoafirmação dessa população.

“O poder público precisa encontrar uma maneira de estimular uma relação equilibrada entre conservação do patrimônio cultural e natural e a melhoria do padrão de vida dos caiçaras. Essa não é uma tarefa simples e essa pesquisa pode contribuir, de alguma maneira, com elementos que devem ser levados em conta nas tomadas de decisões políticas voltadas ao apoio e à inserção econômica e social das comunidades pesqueiras”, conclui Afonso.

Mais informações: marcelum@yahoo.com, com Marcelo Afonso

sábado, 19 de outubro de 2013

OFICINAS DE DIAGNÓSTICO APA MARINHA DO L.N.

Aconteceu dia 14 de outubro em Caraguatatuba a oficina participativa para subsidiar o plano de manejo da APA Marinha do Litoral Norte de São Paulo.
Esse dia foi reservado aos pescadores artesanais e maricultores de pequeno porte.

O plano de manejo é um documento que irá definir o modo como os usos e atividades poderão ser desenvolvidos nos territórios da APAMLN e ARIESS, de forma a garantir a utilização sustentável dos recursos naturais. 
O objetivo das oficinas é levantar junto à população como se utilizam os recursos naturais e o território da APA, assim como a eventual existência de conflitos entre as diferentes atividades identificadas. Também verificar as potencialidades e pensar em como fortalecê-las, para promover o desenvolvimento das atividades de modo sustentável.
Houve na abertura um protesto de cunho político repudiando a APA e suas potenciais decisões, mas nada que tenha interferido no processo já que o caráter "politiqueiro"  usando a tática de "morde e assopra" do protesto ficou muito evidente.  
Importante mesmo foi o mapeamento dos Territórios Pesqueiros feito pelos pescadores e maricultores.
Garantir esses territórios aos pescadores e maricultores artesanais é uma forma de assegurar que essa atividade continue já que envolve aspectos culturais e sociais de grande importância.
 
No grupo da maricultura de pequeno porte, ou artesanal, a participação foi muito eficiente e produtiva.
Isso se deveu ao trabalho conjunto de mais de 15 anos que esse grupo de maricultores desenvolve unido.
Embora a ausência de um representante oficialmente constituído da AMESP, que é a Associação que congrega a maioria desses produtores, esse fato estranho não prejudicou os trabalhos pois não é uma associação que faz a atividade, é a atividade que constrói a associação.
Estavam presentes representantes oficiais da MAPEC, APE, Associação dos Maricultores de Picinguaba e Colônia de Pesca de Caraguá. 
Pontos muito importantes foram elencados, como a necessidade de proibir a pesca amadora e a caça submarina dentro e próximo dos cultivos, exceto em caso de manejo especial autorizado pelo maricultor, já que os cultivos são celeiros geradores e exportadores de vida marinha que contribuem para a recuperação dos estoques pesqueiros. Também a garantia de demarcar áreas de preferência aos maricultores integrantes de comunidades locais foi levantada, assim como o problema causado por embarcações e marinas que usam as boias como balizas de manobras radicais e despejam óleo na água.
Embora 99% dos maricultores hoje usem coletores artificiais para adquirir as sementes na própria área de cultivo, foram demarcados alguns dos bancos naturais de mexilhão devido ao avanço da poluição e dos condomínios que cercam áreas de costeira impedindo o acesso a esses costões rochosos especiais que devem ser protegidos e ter seu livre acesso garantidos.
Foi interessante também a participação no grupo de maricultores de dois extrativistas de mexilhão, que acrescentaram muito expondo seu modo de trabalho e também marcando no mapa seus pontos de extração que devem também, a meu ver, serem protegidos e garantidos.

Fotos: Peter Santos Németh

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

OS PERIGOS DAS TRILHAS DE UBATUBA

Mais uma vez faço menção ao Blog Coisas de Caiçara do meu amigo Zé Ronaldo que muito bem descreveu a importância turistico-antropológica  das trilhas e caminhos de servidão que dão acesso às praias e costeiras de Ubatuba.
Em 2007 quando foi feita mais uma tentativa de atualizar a Lei de Uso e Ocupação do Solo de Ubatuba (a LUOS) através do Projeto de Lei - PL 106, nós do grupo de trabalho da região Centro-Sul atentos a esta importância das trilhas, inserimos na Seção II - Das vias existentes e projetadas, o Item IV - Trilhas e Acessos Tradicionais com o seguinte regramento: Art. 26, §3 - As trilhas e acessos tradicionais também serão mapeadas e classificadas como interesse turístico/social sendo impedidas de intervenções que as descaracterizem em tamanho e largura, sendo permitidas intervenções brandas somente nos casos em que a segurança de turistas e moradores locais estiver comprometida.
Além disso também inserimos os seguintes itens fundamentais que não existiam no PL 106:
XL.São sítios pesqueiros e Aqüícolas são áreas onde são exercidas as atividade econômica da pesca  e da aqüicultura  conhecidos, nomeados, defendidos, delimitados e manejados pelos pescadores e aquicultores  em sua faina pesqueira, territórios de uso das sociedades pesqueiras a partir do trabalho e do conhecimento dos processos naturais que atuam neles.
XLI. uso sustentável, exploração do ambiente de maneira a garantir a perenidade dos recursos ambientais renováveis e dos processos ecológicos, mantendo a biodiversidade e os demais atributos ecológicos de forma socialmente justa e economicamente viável.
XLII. populações tradicionais ,São consideradas populações ou comunidades tradicionais os grupos humanos culturalmente diferenciados, fixados numa determinada região, historicamente reproduzindo seu modo de vida em estreita dependência do meio natural para sua subsistência, notadamente os Caiçaras, os Quilombolas e os Indígenas.
XLIII. trilhas, são os caminhos ou picadas que dão acesso à pontos turísticos tradicionais ou não, caracterizados por permitir apenas o trânsito de pedestres.
XLIV. acessos tradicionais, são os caminhos ou picadas utilizados por comunidades tradicionais.
XLV. comunidade local, população de um bairro representada por sociedade civil organizada e não organizada.
Na oportunidade fiz um giro pela trilha da Ponta do Espia até as Toninhas registrando tudo com algumas fotos.



Percebe-se pelas fotos que antes, onde era um Caminho de Servidão, foram construídas ruas com calçamento e é gritante a descaracterização da Trilha de acesso a Praia do Tapiá que nesta época ainda estava aberta ao livre trânsito de pedestres como assegura nossa Constituição Federal.
Hoje esse Caminho de Servidão encontra-se fechado com cercas de arame farpado à revelia de nossa Carta Magna.
Foto: Julio César Mendes
Pior ainda, o próprio condomínio considera a Praia do Tapiá como uma praia "particular" conforme uma matéria da Revista Veja de 2009:
"Com 137 lotes (dos quais cerca de dez estão à venda) e 55 casas, o Condomínio Ponta das Toninhas virou reduto de bacanas. Localizados no alto de um morro, muitos dos terrenos têm vista cinematográfica para o mar. As casas, todas com mais de 400 metros quadrados de área útil, são negociadas a partir de 1 milhão de reais. "Usamos uma prainha exclusiva, com acesso por uma trilha que começa no loteamento", diz Filippo Frenda, presidente do condomínio. "Isso valoriza os imóveis."
Aliás a reportagem mostra muito bem qual é a "política" que rege nosso patrimônio ambiental em Ubatuba.
Até quando tudo isso poderá ser feito sem qualquer tipo de fiscalização ou providência cabível?
Como bem denunciou o Julinho Mendes em 2011: "Que esse grito seja ouvido pelas associações caiçaras e outras de interesses ecológicos e turísticos e principalmente pela promotoria pública de nosso país". Em http://www.ubaweb.com/revista/g_mascara.php?grc=34976 

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

DESOBEDIÊNCIA CIVIL E A TRADIÇÃO CAIÇARA

Para as comunidades tradicionais que vivem sob regras tácitas de convívio social baseadas na reciprocidade e na confiança entre seus pares, não existe nada pior do que desobedecer a um regramento estabelecido.
Todos conhecem os limites do que é permitido ou não na comunidade e as consequências da desobediência.
Nada pior pra quem depende da instituição comunitária, seja para um mutirão ou para a pesca, do que ser banido do grupo. Perde-se o apoio da comunidade, o convívio grupal, fica-se isolado, sozinho. É uma questão simples de sobrevivência, pois isolado, é muito mais difícil enfrentar as duras tarefas diárias.
O mutirão, também conhecido como putirão, puxirão, adjutório ou troca dia, é uma verdadeira instituição Caiçara de imenso valor social e cultural. Através dele congregam-se várias famílias a fim de ajudar numa tarefa ou empreitada penosa de ser feita em solitário e quem solicitou a ajuda faz a "paga" com bebidas, comida e um baile de Fandango Caiçara.
Durante o mutirão seja para a puxada de uma Canoa Caiçara, para o preparo ou limpeza de uma roça, para a colheita ou para o plantio, estreitam-se as relações sociais. A cachaça que injeta ânimo para o esforço físico, também facilita muito a contação de causos e histórias ocorridas em tempos passados, transmitindo assim a tradição oral de uma geração para outra e reforçando os laços e a identidade cultural.
As técnicas e saberes também vão sendo exercidas em conjunto e naturalmente os Mestres vão coordenando os trabalhos, mostrando os nós, dando e executando comandos, respondendo perguntas, explicando os "porquês" e assim a Cultura não escrita, vai sendo transmitida pela oralidade.
foto: Peter S. Németh
Sábado último, dia 5 de outubro de 2013, houve uma roda de prosa em São Paulo, capital sobre o Fandango Caiçara. Estiveram presentes alguns Mestres Fandangueiros de Cananéia representados pela Família Pereira, o Prof. Doutor Antonio Carlos Diegues, do Nupaub-USP, e cerca de 20 jovens pesquisadores e extensionistas focados e engajados política/filosoficamente nos aspectos socioculturais das Comunidades Caiçaras do Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná.
Foi impressionante perceber durante o encontro que nas várias linhas de frente regionais onde os pesquisadores atuam é tema recorrente o impacto negativo da legislação ambiental vigente sobre a reprodução sociocultural Caiçara, a ponto de ameaçar de extinção esse modo de vida que permanece praticamente inalterado desde o século 16.
Questões fundamentais foram levantadas:
1- Um Caiçara que fez uma viagem pra Curitiba notou que "pra lá num tem um pé de pau, só campo de soja..."; se nos 500 anos em que o Caiçara vive na mata, ela ainda existe, pra que ou pra quem foi feita a lei da mata atlântica? Deve ser pro rei da soja ter sua casa de praia com vista pra floresta e um Caiçara, sem de onde tirar tradicionalmente seu sustento, trabalhando de caseiro para ele.
2- RDS e RESEX, que antes eram vistas como uma solução para que as comunidades pudessem formalizar seu modo tradicional de gerir o próprio espaço territorial e os recursos naturais que utilizam, hoje, com a forma "democrática" de instituir as unidades de conservação, "só participam figurão e seus cupinchas... pois o Caiçara não vai largar seu dia de serviço pra ir..." virou uma ferramenta para o especulador mercantilista. (leia)
3- Uma roça Caiçara (e também a maricultura) atrai e sustenta maior diversidade de fauna e na ausência da roça os animais somem e em menos de 10 anos a floresta já está fechada novamente.
4- Uma roça com milhares de pés de palmito Jussara plantada por um Caiçara em sua própria terra não pode ser cortada; mas e se ele "contratar" para a colheita integrantes de alguma etnia indígena, pode? Aliás foi identificado uma espécie de "ciúme" entre o caiçara e o indígena já que embora ambos sejam "tradicionais" perante a legislação, o índio pode tudo e o caiçara pode nada.
5- Perante a Constituição Federal o Caiçara tem o direito de exercer sua cultura, e esse direito lhe é negado pelas diversas leis ambientais. É urgente enfrentar a legislação inconstitucional trazendo juristas para o embate, criando um "marco legal" que garanta ao Caiçara o direito constitucional de exercer sua cultura, já que seus direitos atuais flutuam ao sabor do entendimento de cada gestor de parque. Mudou o gestor, muda o entendimento e muitas vezes as permissões para trocar uma telha, fazer uma coivara, ou dar um peido sequer demoram seis meses. Qual a dificuldade com a tecnologia atual de tablets, celulares com gps e internet de fazer in loco a autorização? Até a Sabesp e Electro imprimem a conta de água ou luz na hora!
6- Desobediência civil talvez seja a forma de protesto que deva ser iniciada face a urgência de uma solução. Não há mais tempo para discussões, fóruns ou reuniões pois está acabando em diversas regiões a última geração de Mestres Caiçaras que ainda lembra, sabe, faz e transmite a Cultura Caiçara.
7- No entanto, o Caiçara tradicional tende a sempre respeitar a lei, mesmo que seja uma regra em desacordo com o seu universo existencial, ou mesmo que ameacem sua própria existência como são as legislações ambientais. Foi relatado o caso de um Caiçara que foi preso por estar com dois palmitos embarcados em sua canoa. Os palmitos foram plantados por ele próprio, dentro do seu quintal e estavam sendo levados como presente para um parente. O Caiçara tentou suicídio na cadeia, pois seu universo cultural de gerações foi pulverizado em segundos.
8- A agilidade em "oficiar" os órgãos ambientais durante audiências públicas, reuniões e afins, também foi citada como uma estratégia eficiente. Houve um caso em que foi utilizada uma impressora e notebook durante uma audiência pública para gerar documentos e abaixo-assinados protocolados como "contraditório" no mesmo instante.
9- Além da desobediência civil proposta, talvez as recentes decisões do IPHAN reconhecendo o Fandango Caiçara como patrimônio cultural imaterial do Brasil e o pedido de registro dos saberes e fazeres da Canoa Caiçara também possam garantir o direito constitucional dos Caiçaras a sua terra, seus recursos e sua cultura, pois o Fandango é o elemento comum que "amarra" e a Canoa é o veículo que transporta, de uma geração até a outra, todas essas manifestações culturais Caiçaras.

O GALO CANTA (Família Gangsters) veja o vídeo clipe
Conquistar o céu
Ver o Sol de outro planeta
Decifrar a natureza
A fonte do segredo está dentro de nós

O homem busca há tanto tempo
O sopro do vento, um passo maior
Seu caminho, atrás de ciência
Perdeu a inocência
Gastou seu suor

Sonhou com o céu,
De cá, da terra

Conquistar o Sol,
De outro planeta ver o céu
Se sentir um grão de areia
Nas diferenças tão iguais

Respeito... para confrontar
Conceitos que nunca vão mudar
Enquanto sobe o concreto
E as luzes para confundir....
O galo canta!

O galo canta
O dia amanhece
O Sol esquenta
Meu jardim floresce.

fontes:
Blog Canoa Caiçara: http://canoadepau.blogspot.com.br/
Ponto de Cultura Caiçaras - Cananéia: http://galerialagamar.matimperere.com.br/
Enciclopédia Caiçara - Nupaub-USP: http://nupaub.fflch.usp.br/
Projeto O Galo Canta: http://catarse.me/pt/projects/674-o-galo-canta

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

VIOLA CAIÇARA DE CANANÉIA

Viola Caiçara de Cananéia: texto e foto extraídos de Rodolfo Vidal em
https://soundcloud.com/rodolfovidal

Também é conhecida como viola branca, viola iguapeana, viola de fandango e ainda viola fandangueira. A viola caiçara é o principal instrumento musical do fandango caiçara e das manifestações culturais tradicionais de Cananéia, como a Reiada e a Romaria do Divino.

É construída artesanalmente, a partir da caxeta, madeira macia encontrada nas áreas alagadas da região, possuindo cor clara, por isso dado pela maioria dos violeiros o nome de viola branca e é usado para compor o corpo, o braço e a mão do instrumento. Outra madeira utilizada é a canela, para detalhes no tampo, para o rastilho, o cavalete e as cravelhas.

A viola apresenta o braço nivelado com o tampo do instrumento, contendo 10 casas e uma cravelha instalada na junção do braço com o corpo do instrumento chamada por nós de periquita. Essa corda que fica presa nesta cravelha é mais curta, funcionando como um pedal.
Possui, normalmente cinco cordas, podendo, as duas mais graves, serem duplas (ou somente uma delas) e no seu encordoamento, utiliza-se cordas de violão e viola. Sua afinação é (de cima para baixo): lá (periquita) - ré – sol – dó – mi – lá.

Essa viola é encontrada principalmente no litoral sul paulista e no litoral do Paraná, sendo considerada um instrumento típico da região. Com essas características a viola caiçara nunca foi substituída por instrumentos industriais, mantendo sua originalidade.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

"ANARQUIA VINDOURA"

As cidades são sintomáticas da transformação dos sistemas ecológicos sociais pelo ser humano. São centros criativos onde se concentram os mais brilhantes membros de cada sociedade desenvolvendo artes, tecnologia, educação, ciência e comércio.
No entanto, estão de tal forma distantes da realidade cotidiana do ambiente natural que provocam um alheamento em relação às retroalimentações ambientais.
Isso ocorre por haver muitas camadas de informações entre o ambiente natural e os gestores que tomam decisões movidos pela pressão política, avaliação incorreta dos recursos, interesse próprio e corrupção.
O maior impacto da revolução industrial foi o uso de combustíveis fósseis. A emissão na biosfera dos subprodutos gerados por seu uso contribuíram para mudanças biogeoquímicas na atmosfera que levaram alguns séculos para serem sentidas e hoje ameaçam nosso planeta.
Desde os "fogs" londrinos do século 19, a estratificação social aliada ao emprego da força policial e do poder, para manter esse modo de produção de elevados custos humanos e ambientais, ocorreu então, e continua até hoje.
Entre os resultados desse modelo estão: a crescente perda de confiança e reciprocidade (exceto na família); as disparidades cada vez maiores entre pessoas com acesso aos recursos e à riqueza; o aumento no tempo gasto no trabalho e a crescente ênfase no consumo para sustentar a capacidade produtiva desencadeada no planeta.
Nos últimos 60 anos, 1/3 dos países estavam em conflitos armados; 40 milhões de refugiados e desabrigados foram afetados por eles. Cresceu a globalização do terror e do crime; o chamado processo de  "anarquia vindoura" ou "choque de civilizações" (Kates & Parris 2003).
O aumento exponencial de todos esses fenômenos mensuráveis está vinculado ao crescimento populacional somado aos hábitos de consumo. Um cidadão euro-norteamericano consome 25 vezes mais que um cidadão indiano ou sul americano.
(Texto resumido de E. F. Moran, “Meio Ambiente e Ciências Sociais”. São Paulo: Editora Senac, 2011 - Capítulo 1 – O desafio de Pesquisa em Interações Homem-ambiente.)

Abaixo dois links desta semana que corroboram o texto acima.



IPPC - ONU 2013:

foto: mídia ninja em http://www.ebc.com.br/sites/default/files/ninja_congresso.jpg

terça-feira, 24 de setembro de 2013

TERRITÓRIOS PESQUEIROS por Eduardo Schiavone Cardoso

GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 14, pp. 119 - 125, 2003

DA APROPRIAÇÃO DA NATUREZA À CONSTRUÇÃO DE
TERRITÓRIOS PESQUEIROS
Eduardo Schiavone Cardoso*

Resumo:
O presente trabalho discute a questão territorial nas pescarias. Apresenta uma breve discussão do conceito de território no âmbito dos estudos em Geografia para em seguida expor algumas das escalas em que se pode considerar a questão territorial no universo pesqueiro. Revela a existência de uma dimensão territorial na atividade da pesca e aponta para a importância desta categoria no entendimento e na gestão das pescarias.
INTRODUÇÃO
A atividade pesqueira é uma atividade humana que representa uma modalidade de uso do espaço. Sua especificidade reside na articulação entre os meios aquático e terrestre, sendo que o primeiro comporta os processos de apropriação da natureza e o segundo significa os espaços de morada do pescador e o da realização do pescado enquanto mercadoria. Pode-se acrescer ainda o meio aéreo, cujas manifestações interferem diretamente nas pescarias e o subaquático, caracterizando as pescarias como articuladora de um espaço tridimensional (CUNHA,2001).
Como modalidade de uso do espaço, a atividade pesqueira interage com as demais formas que a sociedade produz e reproduz seu espaço. Neste sentido, não se coloca alheia aos processos de urbanização e industrialização acelerados e nem aos processos de degradação ambiental decorrentes do modo de produção hegemônico na atualidade.
A atividade pesqueira interage ainda com as modalidades de uso dos espaços litorâneos e dos recursos hídricos em geral, as primeiras marcadas pela expansão da atividade turística e as segundas marcadas por uma discussão recente de privatização e remodelamento dos organismos de gestão das águas.
Frente a todos esses processos, pescadores defrontam-se com um amplo campo de embate e a politização de seu movimento alcança as discussões dessas questões, que envolvem seus espaços de vida, moradia e trabalho, seu espaço geográfico e seus territórios.
Se a apropriação da natureza por parte dos pescadores - através de seu processo de trabalho e de construção do conhecimento dos elementos naturais que interagem nas pescarias - produz um primeiro nível de territorialidade na atividade pesqueira, aquele do conhecimento, do pertencimento ao meio e da apreensão dos processos naturais, os pescadores artesanais em sua prática e em seu movimento social defrontam-se com outros níveis da territorialidade nas pescarias.
Este trabalho busca discutir estes diferentes níveis da questão territorial nas pescarias, sendo produto de uma tese de doutoramento em Geografia e apontando para a importância da categoria território enquanto um instrumento para a gestão das pescarias.
TERRITÓRIOS PESQUEIROS
O conceito de território, segundo MORAES (1984), é oriundo dos estudos de botânica e zoologia do final do século XVIII. Com a chamada Geografia Crítica, este conceito foi retrabalhado a partir da proposição marxista de que a definição do território passa pelo uso que a sociedade faz de uma determinada porção do globo, a partir de uma relação de apropriação, qualificada pelo trabalho social.
Neste sentido podemos falar em territórios de uso das sociedades pesqueiras, uma vez que estas se apropriam de porções do espaço aquático a partir do trabalho e do conhecimento dos processos naturais que atuam nelas. O território seria então tratado em relação ao seu valor de uso para o grupo social. Bastaria isto para caracterizar uma territorialidade pesqueira?
RATZEL (1990) atenta para uma outra dimensão do território, mediada pelo Estado que teria como função a proteção do território para os indivíduos, contra agressões oriundas do exterior, apontando para a questão da propriedade e da proteção, como atributos do território.
RAFFESTIN (1993) expõe algumas dimensões da territorialidade, quais sejam: a questão do domínio e do poder exercido por um ator sobre uma porção do espaço. Neste caso não se trata apenas de um Estado Nacional e sim qualquer ator que exerça o poder sobre determinado território.
Território poderia então ser definido como uma porção do espaço terrestre sobre o qual um agente qualquer exerce domínio, através do poder gerado por acordos, coerções, ou outro instrumento de dominação.
Podemos entender que existem territórios não apenas como espaços nacionais, geridos por um Estado, mas também no interior dos países, tais como territórios indígenas, territórios quilombolas e mesmo territórios pesqueiros. Estes podem ser delimitados formal ou informalmente garantindo a reprodução dos pescadores e transformando-se em instrumento de gestão das pescarias.
MALDONADO (1993) e MARQUES (1995) estudando pescadores paraibanos e alagoanos, respectivamente, observam que é possível tratar-se de territórios pesqueiros. São espaços conhecidos, nomeados, defendidos, delimitados e manejados pelos pescadores em sua faina pesqueira.
Aceitando tal conceito de territórios pesqueiros, construídos pelos pescadores a partir do trabalho e da apropriação da natureza, territórios que podem ser delimitados mesmo na fluidez do meio aquático e sobre os quais pescadores exercem algum tipo de domínio, ainda resta o desafio do reconhecimento destes pelas demais esferas sociais. É justamente na disputa por estes territórios, entre estruturas de produção na pesca de escalas diferenciadas, que se encontram graves conflitos no interior do setor pesqueiro.
A questão da territorialidade pesqueira fornece também elementos para uma discussão mais ampla a respeito da propriedade dos recursos. Visto em um primeiro plano como recursos comuns e de acesso ilimitado, a apropriação de territórios pesqueiros por parte de pescadores leva à criação de mecanismos que regulam o acesso aos pesqueiros. CORDELL (1983), analisando as pescarias baianas, revela diferentes maneiras do indivíduo se inserir na comunidade e daí ter acesso aos territórios de pesca, sendo o compadrio uma destas instâncias. O mesmo autor fala na lei do respeito, como reguladora do acesso aos pesquei-ros nas localidades que estudou.
Esta questão fornece ainda elementos para discussões na esfera do Direito, reconhecendo ou não práticas comunitárias de exercício do direito e formas próprias de sanções que caracterizariam o uso dos territórios de grupos de pescadores, desde que reconhecidos em outras esferas da sociedade.
Propostas no sentido de reconhecimento formal dos territórios das sociedades de pescadores estão presentes em vários documentos de encontros realizados pelos pescadores artesanais e suas organizações e foram abordados em outra oportunidade (CARDOSO , 2001).
PRÁTICAS TERRITORIAIS DE GESTÃO DAS PESCARIAS
Podem ser destacados dois exemplos relativamente recentes nos quais a questão territorial nas pescarias é bastante proeminente, sendo inclusive criados instrumentos de controle por parte das comunidades envolvidas.
Pescadores amazônicos, através da formulação de "Acordos de Pesca", buscam o manejo dos recursos pesqueiros dos lagos amazônicos proibindo modalidades predatórias de pesca, restringindo áreas e épocas para a pesca e ainda estabelecendo normas diferenciadas para a pesca de subsistência e a pesca comercial, vedando o acesso de determinadas áreas e lagos a esta última.
Esses "Acordos de Pesca" revelam a construção de um instrumento coletivo de gestão do território destas comunidades, ainda que caiba ao Governo Federal o estabelecimento das legis-lações pesqueiras. Revelam ainda uma prática alternativa de direito e uma forte coesão do grupo envolvido no cumprimento dos acordos (FURTADO, 1993; MACGRATH, 1993)
Em uma outra região e realidade pesqueira, iremos também encontrar formas comunitárias de gerenciamento da pesca. No litoral leste do Ceará, pescadores artesanais de lagosta criam seus regulamentos próprios de pesca.
Na Prainha do Canto Verde - CE, através de assembléias, a comunidade estipula as regras válidas para o uso do mar pela comunidade. Nesta comunidade, as questões "de terra" também são tratadas coletivamente, organizando grupos e conselhos comunitários voltados as questões sociais , econômicas e ambientais que atingem a comunidade.
Também no Ceará, na praia de Redonda - Icapuí, iremos encontrar formas coletivas de uso do mar e resistência frente a pesca predatória de lagosta. Nesta localidade, de forte coesão social, conflitos graves envolvendo pescadores artesanais e pescadores de empresas de captura de lagosta, resultaram em mortes de pescadores e apreensão de embarcações empresariais que empregavam compressores na pesca de lagosta.
A partir destes conflitos e após várias denúncias, os pescadores participaram da compra da embarcação Monsenhor Diomedes para fiscalização da pesca predatória em frente às suas áreas tradicionais de pesca e na faixa leste do litoral cearense, forçando acordos de fiscalização com o IBAMA e assumindo parte dos custos desta operação. Essa fiscalização conjunta teve momentos de bom funcionamento, ampliando a área de fiscalização, porém teve momentos de retrocesso, fruto de divergências com o próprio IBAMA, que passava a fazer cada vez mais exigências no aparelhamento da embarcação para poder sair com os seus fiscais.
Estas experiências revelam formas comunitárias de organização e criação de instrumentos de gestão das pescarias, que pressupõe o domínio sobre uma parcela do mar. A presença destes instrumentos de gestão, sugere que a apropriação histórica do território em questão dá aos pescadores envolvidos a legitimidade para estabelecer normas e princípios de uso desta porção do espaço, reconhecidos pela comunidade e susceptíveis de sanções. Seria a expressão de uma gestão comunitária por sobre um território pesqueiro.
Estas premissas podem vir a ser a base de instrumentos de gestão que reconhecem o papel das comunidades, suas formas de organização, apropriação do espaço e construção de territórios, como modelos para serem implantados na gestão dos recursos naturais. Revelam ainda a necessidade de se reconhecer a propriedade comunitária dos recursos naturais e de suas distintas formas de apropriação.
AS RESERVAS EXTRATIVISTAS MARINHAS - TERRITÓRIOS FORMAIS PARA OS PESCADORES
No âmbito da legislação nacional, as Reservas Extrativistas consistem em figuras jurídicas que contemplam, em parte, as premissas citadas na seção anterior. Surgida na luta dos seringueiros amazônicos, esta categoria de uso do espaço foi incorporada ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação e, posteriormente, expandidas para o mundo das águas. Para as águas marinhas a Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé, em Santa Catarina foi a pioneira, criada em 1992 e seguida pela Reserva Extrativista Marinha de Arraial do Cabo-RJ, criada em 1997. Mais recentemente foram implantadas as RESEX Marinhas de Corumbáu e Baía de Iguape na Bahia, além de outras áreas onde se inicia o processo para implantação de novas reservas.
O gerenciamento destas reservas pressupõe a criação de Associações, em que os próprios produtores estipulam seus Planos de Utilização das reservas, além de assumirem a postura de fiscais colaboradores para realizar a tarefa da fiscalização no território da reserva. Nos planos de utilização estão prescritas as modalidades de pesca permitidas e proibidas, além das áreas onde a pesca pode ser realizada e as sanções aos infratores.
O Plano de Utilização da Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé considera os extratores como co-autores e co-gestores na administração da reserva, condicionando a entrada dos extrativistas que moram fora da reserva à aprovação da associação que representa os extratores e do IBAMA.1
Apesar de tratarem-se de formas recentes de uso do espaço, as reservas extrativistas marinhas convivem, por vezes de maneira conflitante, com outras modalidades de uso do espaço. Assim, na Costeira de Pirajubaé, foi realizada uma grande obra de dragagem de areia e construção de um aterro para expandir o sistema viário de Florianópolis, ligando o centro da cidade ao sul da ilha de Santa Catarina, destruindo parte dos bancos de areia que compunham os ecossistemas protegidos pela reserva e de onde os produtores extraíam o berbigão, recurso básico da exploração dos pescadores da reserva.
Mesmo com estas contradições, as reservas extrativistas representam uma modalidade que garante o uso, por parte dos pescadores, dos recursos naturais de seu interior, partindo de normas estabelecidas por eles próprios, ainda que a propriedade pertença ao Estado. Esta categoria de Unidade de Conservação tem sido levada como alternativa para outras áreas pesqueiras e pode ser considerado um instrumento territorial para a gestão das pescarias.
A AQUICULTURA: LIMITES NO MAR
Questões recentes relativas a territorialidade na pesca relacionam-se ao desenvolvimento da aquicultura. Esta atividade, e mais especifi-camente a maricultura, pressupõe uma concessão do espaço marinho para a realização do empreen-dimento em qualquer escala. Ocorre que nem todas as áreas são propícias aos cultivos marinhos e algumas delas vêm sendo disputadas por pescadores e empresas interessadas na maricultura como investimento.
No desenvolvimento da maricultura, uma polêmica se estabelece com relação ao desenvolvimento da carcinocultura marinha. A implantação das fazendas de camarão sobre ecossistemas explorados por pescadores artesanais representa a apropriação privada destas áreas, impedindo o acesso dos demais produtores gerando uma nova fonte de conflito para os pescadores.
Por outro lado, a maricultura e a aquicultura em geral, pode significar uma alternativa econômica para pescadores e suas comunidades e tem mostrado resultados positivos nas áreas em que é implantada junto a estes sujeitos sociais. Algumas experiências têm sido engendradas junto a pescadores artesanais ao longo dos rios, represas e do litoral brasileiro, podendo-se afirmar que trata-se de uma atividade em crescimento e com um futuro promissor.
A maricultura representa uma outra modalidade de apropriação dos recursos marinhos e explicitam uma apropriação territorial do mar por parte de indivíduos, grupos ou empresas. Representa ainda, de acordo com o recurso cultivado, uma forma não predatória de uso dos recursos.
No cenário brasileiro, a maricultura e em especial o cultivo de moluscos bivalves encontra-se bem desenvolvida no Estado de Santa Catarina, alcançando uma produção da ordem de milhares de toneladas, sendo os produtores predominantemente pescadores artesanais.2 Neste estado as áreas propícias ao cultivo são delimitadas em parques aquícolas, cujo gerenciamento é realizado pelas Associações de Maricultores.
A implantação da maricultura junto a pescadores, tem sido fomentada em outras localidades como, por exemplo, na Ilha Grande-RJ e litoral sul do Espírito Santo, através da iniciativa dos poderes locais e mesmo financiamentos governamentais.3
A recém instituida Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca, em 2003, tem na sua agenda o desenvolvimento da aquicultura ao longo das águas brasileiras.
A aquicultura apresenta-se assim, como uma modalidade territorial de uso das águas, cujo ordenamento deverá observar os usos que os pescadores realizam, de modo a não se configurar como mais uma fonte de conflito para o setor da pesca artesanal. Representa também uma possibilidade de incorporação dos pescadores em uma nova atividade, desde que resguardado seus territórios de pesca.
A TERRITORIALIDADE DO ESTADO NACIONAL - NOVOS DESAFIOS
O ordenamento para a exploração da Zona Econômica Exclusiva, situada entre as 12 e 200 milhas náuticas, deliberado na Conferência das Nações Unidas para os Direitos do Mar, realizada em 1982, representa um outro nível da questão territorial na pesca.
Situada entre o livre acesso aos recursos e o domínio territorial do Estado Costeiro, esta modalidade territorial, pressupõe Direitos de Soberania ao Estado Costeiro, mediante o cumpri mento dos acordos internacionais.
A questão que se coloca é a de quais acordos serão firmados para a exploração dos recursos pesqueiros desta zona, uma vez que cabe ao Estado Costeiro levantar o seu potencial pesqueiro desta área que se estende das 12 às 200 milhas marítimas e definir cotas de exploração, que podem ou não serem divididas com outras nações.
É a partir destas deliberações que o Governo Brasileiro tem empreendido o Projeto REVIZZE - Recursos Vivos da Zona Econômica Exclusiva, desde meados dos anos 90, na tentativa de inventariar os recursos pesqueiros desta porção do espaço marinho.
Ocorre que a maioria dos recursos comercialmente explorados encontra-se em situação crítica de exploração, sendo premente a necessidade de diversificação das capturas, algumas das quais deverão ocorrer neste espaço marinho. Realizar acordos com outras nações para a exploração destes recursos, pode significar fechar as possibilidades para a pesca nacional atuar na ZEE.
Uma outra questão refere-se à existência de pesca nestas áreas, realizadas tanto por pescadores artesanais como por empresas que carecem de investimentos e políticas para a renovação de suas frotas ou estruturas de conservação do pescado. Cabe, neste momento, suspender qualquer tipo de acordo com outras nações para a exploração da ZEE, até que a pesca nacional possa ser competitiva na busca destes novos recursos ou na exploração, em áreas mais distantes, dos recursos já existentes.
Trata-se neste caso de afirmar uma outra escala da territorialidade marinha. A escala do Estado e seu território, que deverá por ele ser gerenciado tendo por pressuposto os interesses da Nação. É importante frisar que ocorrem no meio pesqueiro, denúncias de pescarias clandestinas realizadas por embarcações estrangeiras, tendo ocorrido, por exemplo, casos de apreensão de embarcações venezuelanas no norte do país (JORNAL DO DIA, 1998). O oposto também ocorre, com embarcações brasileiras sendo apreendidas nas águas uruguaias.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise das diferentes territorialidades presentes no universo pesqueiro - dos grupos de pescadores, da legislação, das concessões da aquicultura, do Estado-Nação, revela a importância que esta categoria assume enquanto um elemento de gestão das pescarias, por vezes relegada, dada a fluidez do meio aquático.
O território se apresenta como uma categoria a ser empregada na gestão das pescarias. Reconhecer e reservar aos pescadores artesanais o uso de territórios exclusivos para sua prática pode vir a ser um instrumento que garanta a reprodução da pesca artesanal e minimize os conflitos presentes no interior do setor pesqueiro.
Como expressão desta territorialidade, uma franja costeira exclusiva para uso da pesca artesanal - tal como propõe a legislação pesqueira de outras nações - pode ser aplicada no caso brasileiro, complementado pelo ordenamento das distintas formas de pesca nas demais áreas. Em outra escala, pode-se pensar em territórios locais e mesmo regionais destinados aos pescadores artesanais.
Reconhecer tais territórios é reconhecer o poder de gestão dos pescadores artesanais e seu conhecimento acerca dos processos que atuam nas pescarias. Seria contemplar novos enfoques para a administração pesqueira.

Notas
1 Nesta reserva foi implantado um apetrecho de captura de berbigões que preserva este molusco, a medida que a malhagem das telas de captura são dimensionadas para capturar indivíduos que já passaram pelos ciclos reprodutivos.
2Em 1996 a produção foi de 5.202 toneladas de mexilhões e 81.570 kg de ostras (EPAGRI-1998)
3 Na Ilha Grande, o Projeto Desenvolvimento Sustentado da Ilha Grande, implementado pela Prefeitura Municipal de Angra dos Reis em 1996 com financiamento do PED- Projetos de Execução Descentralizada do Ministério do Meio Ambiente., teve como objetivo desenvolver o cultivo de moluscos bivalves junto aos pescadores artesanais desta localidade, gerando uma produção de mais de 30 toneladas de mexilhões e 1000 dúzias de coquiles (vieiras) em três anos de trabalho.

Bibliografia
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CHAVES, Luís Gonzaga Mendes (1975) Pesca Artesanal no Ceará. In Revista de Ciências Sociais. UFC, V.VI, Nos. 1e2, p. 5-28.
CORDELL, John (1983) Locally Managed Sea Territories in Brazilian Coastal Fishing. Roma, FAO, 66p.
COSTA, Rui Nuno Lopes Teixeira Rodrigues (1992) Pensar o Mar Para Poder Pescar : O Espaço da Pesca de Litoral na Baia de Sepetiba, RJ. Rio de Janeiro, 1v. ( Dissertação - Mestrado ) Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
CUNHA, Lúcia Helena de Oliveira. (2001) Conhecimento e Práticas Tradicionais . Texto Digitado Apresentado no Seminário Paisagem e Cultura Caiçara - NUPAUB, 9p.
DIEGUES, Antonio Carlos Sant'ana (1983) Pescadores, Camponeses e Trabalhadores do Mar. São Paulo, Ática. 287 p.
DIEGUES, Antonio Carlos Sant'ana ; CARDOSO, Eduardo Schiavone; LEITÃO, Wilma (1992) Populações Litorâneas, Movimentos Sociais e Ecossistemas da Costa Brasileira. São Paulo, CEMAR. 234p.
EPAGRI (1998) Cadeias Produtivas do Estado de Santa Catarina: Aquicultura e Pesca. Florianópolis, Epagri, Boletim Técnico n. 97, 62p.
FURTADO, Lourdes Gonçalves (1993) "Reservas Pesqueiras", Uma Alternativa de Subsistência e de Preservação Ambiental : Reflexões a Partir de uma Proposta de Pescadores do Médio Amazonas. In: Povos das Águas : Realidade e Perspectivas na Amazônia. Belém, Museu Paraense Emílio Goeldi. p. 243 -276.
JORNAL DO DIA (1998) Barcos Permanecem Apreendidos. Macapá, 15 de agosto.
MACGRATH, David , CASTRO, Fábio de , FUTEMMA, Célia Regina , AMARAL, Benedito Domingues do , CALABRIA, Juliana de Araujo (1993) Manejo Comunitário da Pesca nos Lagos de Várzea do Baixo Amazonas. In: Povos das Águas : Realidade e Perspectivas na Amazônia. Belém, Museu Paraense Emílio Goeldi. p. 213 - 230.
MALDONADO, Simone Carneiro (1993) Mestres e Mares : Espaço e Indivisão na Pesca Marítima. São Paulo, Annablume. 195 p.
 MARQUES, José Geraldo W. (1995) Pescando Pescadores : Etnoecologia Abrangente no Baixo São Francisco Alagoano. São Paulo/Maceió, NUPAUB-USP. 304 p.
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MORAES, Antonio Carlos Robert de (1984) Território. Orientação. São Paulo, Instituto de Geografia-USP, n.5. p. 91.
RAFFESTIN, Claude (1993) Por Uma Geografia do Poder. São Paulo, Ática, 269p.
RATZEL, Friedrich (1990) Geografia do Homem (Antropogeografia). In Ratzel. São Paulo, Ática, Col. Grandes Cientistas Sociais, no. 59, p 32-150.
SANTOS, Milton (1997) Metamorfoses do Espaço Habitado. São Paulo, Hucitec,124p.
SILVA, Luiz Geraldo Santos da (1998) História e Meio Ambiente : A Pequena Pesca Marítima no Brasil. Revista de Sociologia e Política. No. 10/11. p. 219 - 231.

* Professor Doutor. Departamento de Geociências da Universidade Federal de Santa Maria, email: educard@smail.ufsm.br
Praia da Enseada - Ubatuba. foto:  Peter S. Németh

sábado, 14 de setembro de 2013

A ARTE DO "SOBRENÍCIO"

Segundo o "Glossário Caiçara de Ubatuba", sobrenício é um pedaço de madeira esculpido e "afeiçoado" até se encaixar perfeitamente ao rombo a ser consertado em uma Canoa Caiçara.
Como é difícil de se descrever, seguem abaixo as fotos do processo, tal como aprendi com o Mestre Tião Lourenço.


O ROMBO

O PEDAÇO

AFEIÇOANDO

AS FERRAMENTAS