quarta-feira, 24 de julho de 2013

CULTIVOS MARINHOS SUSTENTÁVEIS

Não é de hoje que os pequenos pescadores artesanais, aqueles que pescam em canoas a remo seja com linhada de mão ou tresmalhos, sofrem com a pressão exercida pelos detentores de poder econômico.
Primeiro foram as grandes empresas de pesca que gradativamente foram devastando os recursos costeiros em benefício de seus proprietários, fenômeno conhecido como "depleção serial de estoques". Assim, acabaram com a sardinha, com o cação, com as vieiras zic-zac (aquela da casquinha de siri), com o pargo, e mais recentemente com o polvo, com a corvina e com a tainha, que sempre foi um recurso de importância sociocultural para os pescadores de canoa.
Com todo este declínio, surgiu 15 anos atrás uma alternativa para estes pescadores tradicionais, a maricultura artesanal de mexilhões Perna perna. Esta atividade genuinamente sustentável garantiu uma outra alternativa de renda para as comunidades sem degradar o ambiente marinho, pelo contrário, os cultivos passaram a ser berçários de vida marinha das mais diferentes e variadas espécies.
Hoje outros tipos de ameaça surgem no horizonte sob o rótulo de sustentáveis, mas que na verdade são altamente impactantes e prejudiciais ao ambiente marinho pois necessitam de alimentação através do uso de ração. É o caso das fazendas de engorda de peixes marinhos carnívoros. Nesse tipo de fazenda marinha, 80% do custo de produção vem da ração para alimentar os alevinos, e por sua vez esta ração é feita com pequenos peixes sem valor comercial provenientes da pesca de arrasto.
Agora em julho, estive em Ubatuba e alguns pescadores locais me alertaram que já existem comerciantes comprando dos arrastões de porta TUDO que eles conseguirem arrastar. Só é retirado o lixo e as folhas, o resto, ou seja, os peixinhos miúdos, os camarõezinhos, são comprados por estes atravessadores.
Não posso dizer com certeza o destino desse material, apenas suspeito que o interesse se deve apenas ao valor proteico dessa massa de organismos marinhos compostas por pescados "sem valor comercial".
Me preocupa demais a recente instalação no Litoral Norte de São Paulo de grandes fazendas de psicultura marinha de espécies carnívoras de baixas taxas de conversão para as condições locais. Na minha opinião, estas fazendas vão demandar enormes quantidades de ração feitas com os pequenos peixes locais e podem criar um impacto sem precedentes no que restou de vida marinha na região. Seria o aniquilamento total, o golpe de misericórdia, a etapa final da já citada "depleção serial de estoques" que iniciou com os grandes exemplares como o mero, o cação e vai exterminar com os peixinhos miúdos. Estes peixinhos miúdos, chamados pelos pescadores tradicionais de "comedio" são a base da cadeia trófica e atraem os peixes maiores para perto da costa permitindo que os pequenos pescadores consigam capturá-los em suas canoas a remo. O fundo do mar constantemente revolvido e raspado torna-se um deserto de vida, assim como uma trilha na mata permanece sem vegetação de tanto caminhar-se sobre ela, desse modo vimos nas últimas décadas declinar a captura de espécies comerciais pela pequena pesca.
Sem os peixes naturais do local, extinguem-se os pescadores tradicionais e surge o mercado para os peixes carnívoros de cultivo intensivo que visam apenas o cego lucro que vai concentrar-se na mão de poucos proprietários capitalistas as custas de mais e mais degradação ambiental.
Outro fator preocupante é que qualquer cultivo intensivo de peixes em grande escala é extremamente favorável ao aparecimento de doenças que não ocorrem na natureza e que podem se espalhar para os peixes selvagens.
Enfim, estou extremamente preocupado com o destino da maricultura sustentável, que é o caso do cultivo de moluscos filtradores que não necessitam de ração, como os mexilhões, as vieiras, as ostras e também de plantas como as algas. A pressão econômica e política será gigantesca em favor dos grandes empreendimentos que se apropriaram da palavra sustentável, palavra que perdeu seu real significado e tornou-se uma ferramenta a mais de marketing para a exploração capitalista destruidora da natureza e das populações que sempre viveram em comunhão com o ambiente natural em perfeita simbiose.


Fontes:
1- ftp://ftp.sp.gov.br/ftppesca/serreltec_49.pdf
2- ftp://ftp.sp.gov.br/ftppesca/serreltec_30.pdf
3- http://www.pesca.sp.gov.br/noticia.php?id_not=8174
4- http://www.cbra.org.br/pages/publicacoes/rbra/download/p64-69.pdf
5- http://www.pisceotec.com.br/arquivos/ViabilidadeBijupira.pdf
6- http://www.costanorte.com.br/blog/editorias/cidades/sao-sebastiao/ernane-fecha-parceria-com-empresa-de-maricultura-para-producao-de-bijupiras-2
7- http://amesplitoralnorte.blogspot.com.br/2013/08/resumo-reuniao-amesp-agosto.html

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